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domingo, 19 de fevereiro de 2012

UMA MULHER DO SÉCULO XX



Ela acordou de um sonho. No sonho ela pensou já haver sonhado.
Ela estava grávida- em seu ventre um monstro crescia. E ela sentia muito medo.

Ela era casada com um homem poderoso, autoritário, TIRÂNICO, que além dela, andava com mais nem sei quantas, mas ela era “a oficial”- a traída e amada de maneira obsessivamente negativa.

O casal, após férias na Inglaterra chega à mansão. Mas parece um castelo construído para a cinderela que não podia sair sequer passar do portão. Além dela, do marido, mordomo e empregados, sobem as escadas a prostituta e a gueixa do marido, duas mulheres lindas em sua frente.

Essa mulher calada se casou com um homem bastante violento, dominador, que impunha a espada, verberava pela casa quem mandava, mas ela observava tudo e juntava em sua cabecinha burra o aborrecimento do casamento que se transformou em mágoa.
Ela subia as escadas sabendo que cada mulher: a prostituta, a gueixa, a dissimulada, iriam para os seus quartos com medo. A ansiedade tomava conta do seu peito a cada degrau que pisava porque estava chegando a casa e sabia que o seu marido iria querer fazer sexo brutal e colocar o filme do ultra som do filho- um monstro- no vídeo.

É ela estava grávida de um monstro. Era um feto com dentes de baleia orca, com a cabeça e boca grande, pés pequenos e mãos tortas.

O marido entra em seu quarto, escancara a porta e diz:- Você escolheu a esperança, eu sei que está me traindo com ela, planejando sua fuga, mas eu não vou deixar que você vá. Você vai morrer aqui comigo e calada vai ver seu filho no vídeo, afinal não fiz meu filho sozinho. E agora eu quero te mostrar o que você guarda em seu ventre: O MEDO

Ela sente tanto medo que paralisa, treme, adoece. Calada ela vê o vídeo mais uma vez, e outra, e outra. O TIRÂNICO usa a culpa para mante- La presa em seu quarto, seu cativeiro.

Em um dia de sol insuportável ela abre a janela da sua caverna, seu quarto, e um passarinho bate no vidro. Ela se veste escova os dentes, e levanta da cama como se aqueles fossem os movimentos mais difíceis em sua vida, fora os da víbora em sua glote revirando, a ANGÚSTIA cantando...

Tem um insight... Abre a janela e deixa o VENTO entrar, enquanto ouve o gozo do marido nos quartos da puta e da gueixa, sem parar! O vento lhe sopra em sussurro:- Vá! E ela sai correndo de pavor do TIRÂNICO, da COBRA, do GOZO, mesmo ainda carregando O MEDO, seu feto, sua cria, seu espanto. Ela não se sente coitada- apenas para semblante A POSIÇÃO DE VÍTIMA ostenta.

Calça o tênis e corre. Já estava tão cansada do abuso e sofrimento que sai depressa da mansão- o dote. Vai para a estação de metrô pensando: "- Agora ele vai me matar se descobrir que eu não quero ter esse filho, esse monstro que vai sair de mim. Ele vai me bater tanto!". O TIRÂNICO queria mante- La cativa do MEDO.

No meio do caminho encontra amigos. Por uma amiga da sua filha, pelo vento e pelo representante de medicamentos é levada para a casa de alguém. Mas ela somente quer desaparecer do mundo, abortar o seu monstro, expulsar o que de ruim estava em seu ventre paralisando- a.

Entram todos em uma casa. Essa casa não tem ralo, não tem por onde escorrer a sujeira há tanto guardada, mas se sente confortável, mesmo com dores no corpo por conta da corrida e da gravidez indesejada. De mãos dadas com amigos tenta se esconder do TIRÂNICO, seu marido, da culpa do desejo do aborto do MEDO... Espera sentada, com a filha no colo.

Amigos reunidos lhe dizem: - Nessa casa você não está entre leões, mas entre a solução do seu conflito e a palavra não dita. Está preparada para ver o horror que você cria em seu ventre. Irá fazer dele seu bom humor.

Ela põe a filha no colo e pensa: "- É melhor enfrentar o horror de ter em mim um MONSTRO, que apanhar e ser estuprada todos os dias pela agressividade do meu SUPEREU maldito".

Antes de ver o horror no vídeo, ela pede para orar o Pai Nosso, como a mãe ensinou:..."Pois teu é o reino, o poder e a glória para sempre". Pede para a filha tapar os olhinhos com as mãozinhas que ficam entre abertas com sorriso maroto nos lábios olhando para a tela.  Ela verá o horror de ser ela mesma quem guarda seu tormento.

Ela acolhe as palavras, diz que vai ver o horror antes de abortar o monstro, fruto da violência, e vê tatuado no braço de um dos seus amigos: * = em baixo disso um instrumento musical de sopro. Inicialmente ela pensa: É o demônio! Fica com medo, mas depois, em sua frente flutua a palavra DESTINO.

Aperta o play. Sem pause ou stop encara o ultra som do bicho.

Não se recuperou ainda. Guarda um feto e uma serpente em seu corpo, um medo e angústia em forma de bicho, mas luta sem stop admitindo para ela mesma que está longe de ser uma mulher do século XXI, mas agradecendo ao vento que lhe move, ter criado uma menina de outra geração.

Palavras chave: SUPEREU TIRÂNICO, MEDO, ESPERANÇA.
Metáforas: Marido, feto, casa (psicanálise) 

Malu Calado

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