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domingo, 10 de julho de 2011

A descrição poética de J.M.G Le Clézio sobre Frida Khalo...

No livro: Diego e Frida Biografia-  do Autor e ganhador do Prêmio Nobel de Literatura J.M.G Le Clézio, uma das mais lindas descrições sobre Frida Khalo que eu já li em minha vida!

"(...)No fundo, o extraordinário ao longo da existência caótica do casal Diego/Frida era a dificuldade de juntar dos seres tão díspares. Ambos são criadores e ambos, revolucionários, mas sua criação e sua revolução são diametralmente opostas, e diametralmente opostas suas ideias sobre o amor, sobre a procura da felicidade, sobre a vida mesma. Comparada à paixão política e às intrigas do meio de Diego Rivera- aquela espécie de movimento de pêndulo que o faz oscilar continuamente entre o poder e a fé na revolução, entre os Estados Unidos e a União Soviética-, a vida de Frida Khalo é de uma luminosa simplicidade. (...)

É verdade que a pintura de Frida não é revolucionária, dos muralistas, mas a revolução de Frida é outra... "seu combate não é da arte engajada. Seu combate é interior, ele fala do cotidiano, da vida solitária que ela leva, da prisão do sofrimento, dos ferimentos do amor próprio, da dificuldade de ser uma mulher na sociedade mexicana dominada pelos homens. Sua revolução é também sua revolta, o olhar de amor e de temor que pousa sobre o que a cerca, a obsessão da morte, a compaixão que sente por tudo o que é terno e fraco, o sonho de um abraço universal, esse universo angustiado e delicado que gira em torno da Casa Azul, de seu jardim, dos animais que compartilham de sua vida. Sua revolução é a explosão do sofrimento em seu corpo, as doses são cada vez mais fortes de calmantes (o Demerol) que tem de tomar para suportar a dor, a tragada de maconha que aspira, com ansiedade, para se libertar do malpara roubar um momento de irrealidade e de esquecimento.

Sua revolução é a permanente esperança que ela conserva de vencer seus males e suas dificuldades, aquela Árvore da esperança que se tornou sua coluna vertebral quebrada, consertada com a ajuda de cirurgias e de implantes de ossos. Os quadros que ela pinta durante esses anos exprimem sua mudança de atitude em relação à vida. As cenas mórbidas e sangrentas deram lugar a uma espécie de serenidade desesperada sem equivalente na história da pintura. Por detrás da máscara sempre impassível, o vazio e a angústia cavaram a vertigem, uma interrogação que repercute sem fim entre as paredes refletoras dos espelhos dispostos à sua volta. É assim que Lola Álvarez Bravo a captou nas extraordinárias fotos tiradas em Coyacán em 1944: Frida apaixonada pelo seu reflexo, dispondo em volta de si os espelhos onde é apanhada na armadilha de sua imagem. Não é de sua imagem que ela gosta, é a da realidade física, do calor da vida, da ternura dos sentimentos que lhe escapam pouco a pouco, que se retiram dela como água que escoa, e a deixam na friagem. (...)

Um livro espetacular que aborda com suavidade a revolução política no México e com intensidade poética a revolução interna de Diego e Frida...


Para todos uma boa leitura!


 Malu Calado